Pessoas de lá e de cá

1 12 2008

Os meus pais dinamarqueses tinham três filhos, que já não moravam em casa. O mais velho, Jakob, tinha seus trinta e poucos anos, era casado com Rikke, e moravam em uma cidade na Grande Copenhaguen. Por coincidência, a filha do meio também se chamava Rikke, estava próxima dos 30 anos e era casada com Per, e também moravam em Copenhaguen. Annie, a caçula, tinha 25 anos e estudava na universidade da cidade de Århus. Sempre recebíamos visitas deles, alternadamente, mas somente no Natal a família conseguiu se reunir completamente.

Christa e Vagn tinham também uma grande amiga, companheira para todas as horas: Juliana, uma refugiada da Guerra da Iugoslávia e suas duas filhas, Vera, de 7 e Andrea, de 5. Tinham uma experiência de vida enorme, e muita história para contar. E as crianças eram muito inteligentes, pois tão novas e já falavam 4 línguas: sérvio (por causa do pai), húngaro (por causa da mãe), inglês (por causa da necessidade) e dinamarquês (por causa da escola). Juliana era um grande exemplo do Estado de Bem-Estar Social da Dinamarca, que abriga indistintamente seus cidadãos e os refugiados que escolhem o país como lar. Recebia seguridade social, e suas filhas tinham direito a educação e saúde pública como qualquer cidadão dinamarquês. 

Na escola, me relacionava bem com todos, alunos e professores. Sempre era convidado a falar sobre o Brasil nas outras turmas, em inglês no início e em dinamarquês após aprender o idioma. Consegui até descolar um “bico” na biblioteca da escola, organizando os livros nas prateleiras e faturando uma graninha extra.

No Grupo Escoteiro, também fiz amigos incríveis, principalmente a Karina, que adorou a idéia do intercâmbio e resolveu receber um estudante de intercâmbio em sua casa no ano seguinte. Por coincidência, seu “irmão”, também foi brasileiro. Logo depois, ela resolveu ser intercambista e passou um ano na Venezuela. Em 2004, aproveitou uma visita à sua família venezuelana e deu uma esticadinha ao Brasil, visitando seu “irmão” em São Paulo e a mim no Rio de Janeiro. Karina gostou tanto da sua experiência de intercâmbio que trabalha até hoje no AFS da Dinamarca.

Para reforçar o nosso aprendizado de dinamarquês, o AFS disponibilizou um professor para os intercambistas. Aproveitando a turma, o Rotary e a Baltic Bridge também inscreveu seus estudantes no curso, aumentando a torre de babel em alguns países: além do Brasil, Letônia, México, Austrália, Tailândia, Hungria e Turquia, juntaram-se a nós estudantes dos Estados Unidos e da Estônia. Dessa forma, uma vez por semana, todos os intercambistas da ilha se reuniam para conversar e trocar experiências, muito mais do que realmente estudar a língua.

Assim, minha agenda estava sendo preenchida com muitas atividades: Grupo de Jovens na terça-feira, escotismo na quarta, aula de dinamarquês na quinta, escola de segunda a sexta das 7h às 15h, em média. Bico na biblioteca pelo menos duas vezes por semana, e muita bicicleta para todos os lados!

Ao mesmo tempo que procurava me adapatar a essa nova realidade, uma grande ajuda apareceu de um lugar inesperado: a Denise, que antes da minha viagem era a paixão adolescente de todos os meninos da turma “lá da rua”, fez intercâmbio nos Estados Unidos na mesma época, e passamos a trocar cartas praticamente toda semana. Conversas sobre situações vividas, experiências adquiridas, os diversos sentimentos por que passa um intercambista, todas essas semelhanças nos aproximou de uma forma que nos considerávamos praticamente irmãos naquele período.

Com a popularização do Facebook no Brasil, comecei a reencontrar muitas dessas pessoas que foram inesquecíveis no meu intercâmbio. A parte mais divertida é descobrir que não mudaram quase nada, mesmo 15 anos depois. Geralmente, o que mudou foi o número de herdeiros que trouxeram ao mundo. Eu continuo na mesma…


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